sexta-feira, 25 de março de 2016

CAPÍTULO V Ingenuidade tem limite...


Augusto começa o dia feliz, acredita que sua investida deu resultado. Só não entendeu o porquê do desejo de manter tudo em segredo, mas a noite tinha sido tão intensa que ele não queria perder tempo tentando entender, até porque as mulheres têm seus mistérios e isto é o que as torna tão atraentes.
Augusto estava apostando suas fichas em alguns pré-candidatos a prefeito da sua região. Claro que uns com maiores chances e outros apenas colocavam seus nomes no cenário para o futuro. Ele sabia muito bem avaliar o potencial de cada um e, mais ainda, sabia como deixá-los sob seu comando. Exercia seu poder de persuasão com perícia, jogava para que apenas as peças interessantes avançassem  para a próxima etapa.
No grupo de Augusto está Samuel, um novato no meio político e que pretende seguir a “carreira”. Quer se eleger prefeito e depois deputado, o problema é que as escolhas o tiravam do caminho do sucesso, pelo menos do ponto de vista de Augusto.
Samuel é inseguro e teimoso, apesar de ser um nome novo e ter algum conhecimento na área política, tem um romantismo que não cabe no meio político e uma ingenuidade que muitas vezes se aproxima da burrice. Tenta imprimir uma nova marca, só que sua escola política é arcaica, apesar de ter um verniz está sempre em situações adversas, tem uma personalidade frágil e não tem liderança, resultando num comprometimento de suas ações, seu discurso é vazio e não corrobora para sua sustentação no concorrido meio político.
Para Augusto, a política é algo complexo e que precisa de pericia, algo que Samuel não tinha. Para torná-lo um candidato a altura de seu apoio, muito tinha que ser feito. A malícia política só se adquire com o tempo, com a vivência e com as negociações. Samuel não era um bom negociador, parecia implorar ajuda e não se impunha  numa mesa de negociações, algo crucial para alguém que deseja trilhar no meio político.
Samuel temia Augusto, porque sabia que era um homem autoritário e centralizador, habilidades que ele não possuía. Todas às vezes, que precisava falar com Augusto procurava alguém para acompanhá-lo e se possível solicitava que um assessor fosse em seu lugar. Tinha um receio enorme em cometer algum erro ou dizer algo que pudesse comprometer sua carreira política, sabia que dependia do apoio de Augusto para se candidatar.
Augusto chama Samuel para orientá-lo sobre algumas medidas que deveria tomar, o momento era de ajustes partidários. Logo percebeu que a inexperiência de Samuel poderia comprometer a conquista de novos parceiros. Pensou em alguém que pudesse orientá-lo. Decidiu que conversaria com sua amiga, quem sabe ela poderia ajudá-lo, a única coisa que teria que resolver é o ciúme que sente.
Ernesto está em meio à tempestade, sua vida está sendo vasculhada e ele vigiado por todos, imprensa, colaboradores e pares políticos. Cada passo dado tem que ser meticulosamente medido. A pressão é grande, as ações ganham outro peso e ele está sentido. A fragilidade dele traz um desconforto para o governador, que fica exposto também. Ainda, tem que resolver a questão do pré-candidato que terá que desistir para atender ao combinado com Augusto. O stress toma conta do dia. Na percepção dele há uma grande crise política eminente, que o desestabilizaria, já que desempenha o papel de moderador no governo. Toda crise obriga aos atores envolvidos se reinventarem, o problema é que não sabia como fazer, sem se colocar em risco e blindar o governador.
A crise no meio político tem efeito cascata, porque todos estão interligados. Quando Ernesto aparece no noticiário como alguém que está sendo investigado, Augusto comemora. Como é interessante a política, quem comemora o desconforto de um acabara de vivenciar uma crise em seu governo. O que importa é o enfraquecimento de seu opositor, neste caso é o chamado “fogo amigo”, porque os dois pertencem ao mesmo partido e grupo político.
Enquanto isto, nos bastidores, as intrigas, mentiras e apunhaladas pelas costas rolam solta. Samuel tem uma assessoria que dispensa apresentação, por ser inseguro foi agregando em seu grupo pessoas de índole duvidosa, causando ao longo do tempo danos irreparáveis ao seu projeto. Quem está a frente de um projeto sofre inúmeras afrontas e precisa engolir muitos sapos, tem que ter equilíbrio emocional e ser indiferente a certos achaques. Tem aqueles que vivem das migalhas dos outros, os que gostam de promover a discórdia, esses quase sempre não constroem nada, e tem os que ficam adorando a todos, buscando ser necessário. Administrar todos esses perfis é uma tarefa árdua, Augusto e Ernesto, sabem muito bem como tratar esses personagens, que muitas vezes, são necessários dentro do cenário político.
Ao lado de Samuel está Coriolano, um novo assessor, dissidente de uma bandeira política de oposição, chegou com vontade de desconstruir a equipe ao qual pertencia. Alguns alertavam sobre o perfil arrogante e prepotente de Coriolano e que, assim como, naquele momento ele estava contra seu antigo partido, amanhã faria o mesmo com Samuel. O afã de conseguir “engrossar o caldo” promoveu fissuras profundas e jamais curadas. Impediu que Samuel percebesse que  abrigara  em seu ninho um esquerdista, corrupto, capaz de roubar,  mentir e de praticar crimes fiscais para manter sua vida estável.
A chegada de Coriolano causou muito desconforto, a postura dele destoava do contexto político do grupo de Samuel, as diferenças de opiniões eram gritantes. Coriolano se dizia um expert em planejamento político, era possível, no entanto, ele tinha uma linha de raciocínio que era antagônica a adota pelo grupo que antecedia a chegada dele, daí o começo dos conflitos.
Samuel estava num momento de muita cobrança, ele tinha que definir sua filiação partidária. Estava filiado a um partido em acessão, no entanto, com grande dificuldade de se manter. Do outro lado, Augusto tentava abrir espaço no partido dele para Samuel, o que não estava nada fácil. Muitas negociações abertas e poucos avanços, Samuel não passava segurança dificultando as investidas de Augusto, mesmo ele tão experiente e com grande poder de negociação tinha suas limitações. O partido sempre olha as futuras eleições e não abre espaço para um candidato que não seja promissor.

Augusto consultou a pessoa de sua confiança no grupo de Samuel, e já sabia das limitações e dificuldades de negociação dele. Tentou articular a ida dele para seu partido, mas Samuel colocou tudo a perder caindo em uma armadilha orquestrada por Carlos Eduardo...

segunda-feira, 14 de março de 2016

CAPÍTULO IV - Negociar é a ordem


Ernesto chega a Verdes Mares, cidade vizinha a Alegre. Encontra sua antiga parceira, os dois conversam e ele sai mais aliviado e otimista, conseguiu uma aliada para sua batalha com Augusto. Eles almoçam juntos e Ernesto parte para Alegre, onde é aguardado. Uma reunião a portas fechadas com Augusto e mais um problema para resolver. Ele conseguiu aplacar a situação acordando que recuaria no momento oportuno, e tiraria o seu pré-candidato da disputa. Muitas vezes é preciso cortar na própria carne, o desafio agora é convencer seu pupilo de que não é o momento para se candidatar, ele jamais poderia saber que foi parte de um acordo com Augusto, seria devastador e Ernesto o perderia. O momento exigia destreza e qualquer perda seria inadmissível.
Na volta para capital, Ernesto é informado que Gilberto agendou uma reunião para manhã do dia seguinte com todo seu staff e que a crise na segurança pública e as denuncias estavam na pauta. Tratou de ligar para seus assessores de imprensa e jurídico e marcou uma reunião para noite, precisava estabelecer uma estratégia para se defender das acusações infundadas que estava sofrendo. Ligou para o Secretário de Segurança Pública para sentir se a reunião tinha surtido efeito.
Em Alegre, Augusto se encontra com Marcelo, Samuel e Fabrício para uma reunião de urgência, precisava participar seus apadrinhados de que o jogo seria pesado e esclarecer que não deviam criticar ou se posicionar no caso do  anuncio do pré candidato apoiado por Ernesto.
                _ Não me façam perguntas, apenas façam o que estou mandando.
Fabrício, que em tese seria o mais prejudicado, questiona se algo será feito para reverter o caso. Augusto se irrita e deixa claro que não é para tomar partido de nada, o momento é de silenciar. Estrategicamente, o momento é de recuar para contra-atacar, tem que se ter muita calma, a derrota momentânea garantirá a vitória final.
Marcelo demonstra todo o seu descontentamento, não gosta de recuar nunca. Samuel é mais inexperiente e prefere ficar na zona de conforto, tem muito receio em se posicionar e escolher o lado errado. Antes de tomar qualquer decisão, se reporta a um assessor que o orienta sobre como se posicionar numa ou noutra situação.
Augusto estava sofrendo pressão de todos os lados, a oposição estava revirando as gavetas dele para encontrar algo que pudesse incriminá-lo. Seu perfil não agradava a todos, muito embora fosse um político capaz de aglutinar apoio, tinha aqueles que o odiavam pelo seu jeito autoritário e agressivo. A vida pessoal de Augusto o deixava exposto, ele sempre gostou de bebidas e, às vezes, utilizava outras substâncias para manter a excitação. E as conseqüências eram sempre devastadoras, se expunha publicamente e a oposição não perdoava.
Naquele momento, ele precisava agradar a oposição, para minimizar os estragos que uma festa ocorrida no fim de semana em seu apartamento, tinha lhe causado. As fotos que estavam nas mãos dos vereadores da oposição eram altamente comprometedoras. E as exigências feitas pelos opositores eram surreal. Ele não tinha muitas opções, tinha que sentar para negociar.
Negociar não era problema. Sempre foi bom negociador, era um empresário respeitado e que atuava em vários ramos. Agora, engolir os risos e as alfinetadas dos vereadores quanto a sua performance depois de uma noite de pura farra, era algo que ele não sabia administrar. A pressão era grande e ter que negociar com quem estava tentando levar vantagem de uma situação da vida privada, era o mesmo que ter que engolir uma espada, cortava na alma.
A mesa de negociações foi aberta, os ânimos estavam exaltados. Todos se sentiam no direito de fazer solicitações das mais variadas, de cargos até prestações de serviços públicos e indicações para parentes. Augusto perdeu a paciência, jogou as cartas para o alto.
                _ Se vocês querem me ferrar, me ferrem. Não vou negociar com ninguém. Estão pensando o que? Que vão chegar aqui e me chantagear assim? Estão loucos?
Os nobres edis não esperavam por aquela reação. Ficaram atônitos, todos se olhavam como se não acreditassem na reação dele. Eles não sabiam como reagir àquela atitude, não tinham um plano B. A decisão foi sair e estabelecer uma nova estratégia.
                _ Querem negociar? Vamos fazer isto abertamente, em público, querem? Esbravejava Augusto.
Ele tinha consciência do que estava falando, sabia que seria impossível e os vereadores também. Naquele momento era a única coisa que ocorria para que ele ganhasse tempo e pudesse chamar para uma negociação individual,  o que deixaria a conta muito menor. Ele sabia que uma conversa reservada poderia até ser lucrativa, já que também tinha algumas informações sobre um ou outro vereador. Claro que não colocaria estas informações na mesa com todos juntos, agora numa conversa reservada, cada um mostra seu poder de fogo.
Logo que deu por encerrada a reunião e os vereadores saíram, o primeiro se apressou em ligar. Ele comemorou, estava certo. Atendeu e decidiu que só atenderia dois dias depois. Agendou e ficou aguardando o próximo telefonema. Como esperado, todos ligaram e as agendas foram feitas. Alguns tinham pretensões futuras e ele sabia muito bem barganhar com eles neste campo. Ter o apoio dele para as próximas eleições era muito importante para quem pretendia se reeleger ou se candidatar a vice-prefeito.
A noite chegou e ele foi para casa, aliviado. No caminho, decidiu ligar para alguém com quem  tinha uma relação especial.
                _ Tá onde?
                _ Em casa. Diz a voz do outro lado.
                _ Vem pra cá, estou precisando conversar com você.
                _ Hoje não posso.
                _ Por quê?
                _ Depois te falo.
                _ Preciso muito conversar com você, meu dia foi péssimo. Começou com uma reunião horrível e terminou pior ainda. Vem pra cá, estou pedindo.
                _ Não tenho como. Vem você...
                _ Não pode vir aqui e eu posso ir até ai?
                _ Pode.
                _ Vou passar no apartamento deixar umas coisas e vou.  Você vence sempre.
                _ Estarei te esperando.
Augusto segue para seu apartamento, guarda alguns documentos em seu cofre particular.  E pega uma caixa com um belo anel. Ele estava decidido a presentear sua querida amiga. Já tinham uma relação de muitos anos e acreditava que o momento era para dar um passo mais sério. Só uma coisa incomodava Augusto, a sua querida amiga tinha uma proximidade com um desafeto político, mas ele acreditava que podia resolver facilmente isto.
Na capital, Ernesto se encontra com seus assessores em seu apartamento. Paulo apresenta uma matéria que soltaria na imprensa com as explicações de Ernesto para os assuntos que estão sendo explorados pela oposição. O jurídico traz boas e más notícias, deixando-o mais tenso. Sabe que a reunião da manhã seguinte será tensa e que Gilberto não irá tolerar falhas. Quando termina a reunião, uma ligação.
                _ Tudo bem? Pensou no meu pedido?
Ele ouve o que esperava. Seu pedido estava sendo atendido. Motivo para comemorar.
                _ Se estivesse aqui tomaríamos juntos um bom vinho.
Ele desliga e pensa que tudo poderia ser diferente se ele tivesse investido mais naquela relação. Só que o tempo passou e tudo ficou para trás.
Na manhã seguinte, a reunião com Gilberto é muito tensa. Todos são cobrados e novas metas são estabelecidas, alguns erros são inaceitáveis e Ernesto é cobrado. Ele se sente na berlinda, segura a ira e leva a reunião até o fim. As noticias de sua interferência na Secretaria de Segurança Pública foram positivas. O Secretário da pasta trouxe boas notícias, os ânimos estavam mais calmos, agora as propostas precisavam ser colocadas em prática. Gilberto parabeniza Ernesto, que respira aliviado, esta demonstração de confiança é muito importante para que todos saibam que a relação entre eles está preservada.
O momento era de negociação, as eleições municipais estavam próximas. Ernesto tinha muitos municípios para administrar e um problema para resolver, retirar a candidatura de seu pupilo como prometeu para Augusto.

sábado, 5 de março de 2016

CAPÍTULO III - Nos bastidores do poder muitas discussões acaloradas


Augusto chega a Alegre, um município planejado e em desenvolvimento, administrado por ele com pulso firme.  Ao saber das notícias e do lançamento da candidatura de um desafeto, ficou extremamente irritado. Chamou Nilson, seu assessor pessoal de longa data e pediu que averiguasse os fatos. Ligou para Ernesto e cobrou que o jogo fosse limpo, avisou que também poderia jogar pesado, o que não seria benéfico para ninguém.
Seguramente, o assunto seria responsável por parte do dia de Augusto, que não é um homem que se deixa vencer fácil. Não admite perder e sabe traçar uma estratégia como ninguém. Aproveitou para fazer algumas ligações e apurou algumas fragilidades de Ernesto, pensou que seria positivo ter uma carta na manga.
A notícia repercutiu em todo o meio político, para quem não é do meio, pode parecer pouco, já que não há um só candidato por região, no entanto, para um político do calibre de Augusto era extremamente grave e altamente vexatório. E um homem como ele, jamais deixaria de assumir as rédeas da situação, faria de tudo para reverter e impedir a candidatura de seu desafeto.
Ernesto logo percebeu que sua jogada causaria dor de cabeça. Gilberto não havia gostado nada das conseqüências da manobra política feita, e fez questão de esclarecer com Ernesto que aquele passo colocaria em jogo outras “costuras” políticas que envolviam Augusto, que era uma das mais importantes e respeita liderança da região.
                _ Ernesto, sabe como está sendo difícil convencer o Augusto e ter o apoio dele nas matérias que precisamos aprovar dentro da Assembléia. Fazer uma guerra de braços com ele agora não vai nos ajudar.
                _ Sei disto, Gilberto. Por outro lado, criamos um fato político que promoveu inúmeros questionamentos, na nossa base e na oposição. E isto pode nos favorecer, assim tiramos o foco das questões que estão ganhando espaço na imprensa.
                _ Temos que apurar os fatos, não quero minha administração manchada por irregularidades, que supostamente foram desenvolvidas por outros. Vou afastar todos aqueles que tiverem seus nomes envolvidos em possíveis irregularidades, todos que forem denunciados  pelo Ministério Público serão afastados, ficou claro?
                _ Já entendi. Vou tomar minhas providencias. E vou ligar para o Augusto.
                _ Saio em viagem após o almoço, sugiro que você permaneça e inicie ações para corrigir os problemas que estão ganhando espaço na mídia. Está é a única forma de resolvermos, não é criando outro factóide.
Ernesto sai da sala de reuniões enfurecido, acreditava que demonstrar ao Augusto seu poder de articulação era uma medida positiva, capaz de delimitar espaços. Logo sentiu que a luta com Augusto não seria fácil. Ao chegar a seu gabinete, recebeu a notícia de que seus apadrinhados que estavam em empregos na região do Augusto tinham sido demitidos. Ligou para todos os envolvidos e não obteve retorno positivo.
O momento não era bom, denúncias e desgastes dentro do governo, exposição pública de sua vida pessoal, parecia que Ernesto vivia seu inferno astral. Entre uma reunião e outra, pensou em alguém que poderia ajudá-lo, não perdeu tempo ligou imediatamente para uma parceira com quem não falava desde outro episódio de ordem pessoal.
                _ Preciso da sua ajuda, é muito importante.
                _ Quem é?
                _ Faz tanto tempo que não tem mais o meu número registrado?
                _ Ernesto? Está precisando de alguma coisa?
                _ Preciso que venha até aqui, temos que conversar.
                _ Não tenho nenhuma viagem programada.
                _ Preciso da sua ajuda, preciso falar com você pessoalmente.
                _ Pegue um helicóptero e venha até aqui.
                _ Você está me tratando com tanta frieza, está magoada ainda... Vamos tentar apaziguar isto,  mando um carro para te apanhar, pode ser assim?
                _ Não. Tenho meus compromissos, senhor secretário de estado.
                _ Entendi. Vou tentar resolver de outro jeito, agradeço pela atenção.
Ernesto fica intrigado. Acreditava que seria atendido imediatamente, ela sempre o atendeu. Será que tinha perdido mais uma para o Augusto? A situação se agravava, o dia estava intenso e repleto de problemas. Além dos problemas diários, tinha que resolver as questões políticas, encontrar soluções para situações administrativas que envolviam outros secretários e melindres, conseguir se defender das acusações que estava sofrendo, parecia enlouquecedor.
Conseguir contornar egos é um desafio, qualquer decisão que tomasse iria ferir um aqui e outro ali. A arte da negociação é para poucos, Ernesto era bom nisto. O primeiro e mais importante problema a ser solucionado, era uma crise no alto comando da segurança pública que estava tirando o sono do Governador, cabia a ele equacionar os conflitos  e arrefecer os envolvidos.
No meio político, mais do que em outras áreas, as discussões tem sempre dois lados. As questões partidárias e de território são sempre muito valorizadas. Ao contrário do que deveria ser, nem sempre as atitudes e escolhas tem como foco o bem estar da população, muitas vezes os interesses políticos e partidos se sobrepõe aos interesses da massa.

Ele chamou o alto escalão da Segurança Pública e tentou exaustivamente contornar os problemas existentes entre o secretário da pasta e os comandos das policias, militar e civil. Nem parecia que estavam todos no mesmo barco, eram trocas de acusações e farpas para todos os lados. O principal motivo, o novo comandante da Polícia Militar chegou promovendo uma limpeza no seu efetivo, em 1 mês tinha prendido mais de 100 policiais corruptos. Causando certo descontentamento dentro da corporação. Dentro da Policia Civil a falta de efetivos era o maior problema, os casos de corrupção interna que vinham sendo investigados a todo vapor estavam sendo deixados de lado, com desculpa de número insuficiente de pessoal, para o Secretário de Estado, uma desculpa para acobertar os corruptos que se escondem atrás dos distintivos e coletes.
A pressão era grande, queriam a cabeça do Secretário que por sua vez queria trocar os dois comandos. A posição do Governador era de manter todos e melhorar o relacionamento, ele sabia que todos tinham  certa razão e que mediar um acordo entre eles era menos danoso no momento político que enfrentava. Ernesto tinha esta tarefa para cumprir. Em 30 minutos de reunião, houve só trocas de acusações e exposições dos pontos fracos de um e outro. Para tentar equacionar a situação, Ernesto podia fazer concessões  e as fez.
Determinou a abertura de novos concursos para aumentar o efetivo da policia civil, melhorias nos benefícios e investimento em novos equipamentos. A polícia militar, também receberia novos equipamentos e, finalmente,  um projeto de lei propondo   que as armas apreendidas pudessem ser utilizadas pelas policias seria enviado para a Assembléia.  O Secretário da pasta deveria diminuir os índices de criminalidade, os maiores da última década, e precisava do envolvimento e emprenho de todos. Após estabelecerem prazos e metas, a reunião terminou com um clima menos hostil.

Ernesto saiu exausto, pensando em como conduzir os problemas com Augusto. Tinha que pensar em alternativas rápidas, como precisava conversar com sua antiga parceira ele decidiu ir até a região. Nada melhor do que uma conversa franca  e cara a cara. 

quarta-feira, 2 de março de 2016

CAPÍTULO II A festa continua


Alguns saem à francesa. Preferem não permanecer na parte mais quente da festa. Depois de  certa hora, o clima esquenta, todos já dançam sem se preocupar com o ridículo. A sensualidade se espalha, algumas pessoas se aproveitam para conseguir pequenos favores, outros apenas se divertem. Fotos são proibidas, melhor não haver registro destes momentos.
As decisões que foram tomadas antes são cochichadas aqui e ali. Um diz que saiu vitorioso porque conseguiu finalizar uma negociação de meses, outro que conseguiu liberar um processo que se arrastava e outro diz que tem uma promessa de trabalho. Assim, cada um do seu modo, conta uma vantagem. Entre uma bebida e troca de caricias, alguns arriscam outras negociações.
Neste contexto está Fabrício, um jovem promissor e extremamente sedutor que sabe usar seus encantos como ninguém. Ele mantém quase todas as assessoras de “seus padrinhos” fieis aos seus “sonhos”. Com chances de galgar o cargo de prefeito de Felicidade, tem seu foco no apoio das principais lideranças de seu partido.
Fabrício se jogou na pista de dança e logo foi fisgado por uma modelete que fora convidada por um de seus padrinhos. Ele nunca investia em alguém só para satisfazer seu desejo, sabia que podia conseguir algumas informações preciosas e usaria seu poder de sedução para garantir mais uma fonte.
Naquela festa todos podiam se dar bem, Benito era o típico capacho, vivia das migalhas deixadas pelos outros, sempre na espreita a espera de um político desavisado que pudesse olhar pra aquela figura asquerosa. Ele era um tipo pouco atraente,  andava sempre mau vestido e mau cheiroso, sempre com uma postura de fracassado. Ele é advogado, nunca teve sucesso, tentou a vida política e vive desta sua única tentativa, apesar de já ter passado 10 anos.
Ao ver Benito,  Fabrício decide maneirar porque sabe que pode ser “lembrado” depois do que estava fazendo naquela festa. E Fabrício não era o tipo que ficava nas mãos de ninguém. Ele fez escola com Augusto, que era muito perspicaz e sabia fazer o outro dever algum favor a ele, mas ele jamais devia favores...
Benito não costumava se da bem nas festas, era desprezado porque todos sabiam de sua estória. Ele não convencia ninguém, era o típico mentiroso e tentava enrolar a todos. Acreditava que bajulando um ou outro conseguiria facilitar alguma coisa. Trabalhar não era exatamente algo que ele desejava. Procurava sempre aplicar um golpe que lhe rendesse algum dinheiro para sobreviver por alguns meses.
A casa ampla deixava o som ecoar pela madrugada. As cortinas de seda, os tapetes e os cristais encantavam aos olhos dos mais atentos. A bela casa era de um grande empresário do ramo da construção civil, muito utilizada para reuniões políticas das grandes lideranças da nação. Aquela altura as duas piscinas já estavam movimentadas, a noite de verão convidava a um mergulho.
Entre um whisky, um mergulho e celulares que tocavam na madrugada, os empresários aproveitavam para afinar a conversa com as lideranças políticas, era garantia de uma porta aberta no dia seguinte. E assim a noite seguia.  O momento político era tenso, as eleições estavam se aproximando e muitos interesses estavam em jogo. Alguns eram ambiciosos, tinham pretensões de serem indicados para o senado ou câmara federal, só que nem sempre as pretensões e o estofo político eram compatíveis.
Otelo era um destes casos. Filho de um político conhecido, que fora envolvido em alguns escândalos, tentou a carreira de marketing político, sem ter grande ascensão voltou-se,  como seu irmão, para a política. O perfil de Otelo era de bom moço, sempre submisso a esposa, ao pai e aos irmãos mais velhos. Tinha problemas com sua auto-estima, porque era um homem com um tipo físico que fugia aos padrões estéticos da moda.
Sua retidão de caráter, muitas vezes, era um grande problema para obter espaço no meio político, não era exatamente alguém que pactuava com as amarrações feitas na madrugada, em festas e regada a bebidas, como  a que acontecia naquela noite. Otelo estava na festa porque precisava garantir a indicação de um velho amigo de seu pai. Mesmo contrariado e incomodado, mantinha-se firme ao seu propósito, em seu intimo acreditava ser capaz de fazer a diferença. Diante dos fatos, teria Otelo alguma chance de fazer a diferença?
A madrugada passa rápida e o dia começa a amanhecer. Alguns já se preparam para tomar o café da manhã e seguirem para seus redutos políticos. No jornal da manhã, já aparece uma nota sobre a indicação de um nome para deputado federal, alguns olhares e sorrisos confirmam que a negociação tinha se dado naquela noite, durante a festa.
Ernesto comemora a noticia, o nome sugerido por ele havia sido anunciado como pré-candidato a deputado na região política de Ângelo. Esta era uma grande vitoria, era mais um passo dado para convencer Ângelo a apoiar Saulo.
Ernesto liga para Paulo seu assessor de imprensa.
                _ Cada peça movimentada acertadamente é um avanço. Você foi muito eficiente tornando noticia logo pela manhã.
                _ Usei minha fonte, sempre infalível, respondeu Paulo
                _ Mantenha seus contatos, sabe como são importantes. Parabéns!
Durante o café, Pedro que é o dono da casa, comemora com Ernesto a cartada de mestre dada por ele.
                _ Foi perfeita a sua manobra. Depois desta, o Ângelo entenderá que o melhor é compor, assim todos ficarão confortáveis.
                _ Sabe que com o Ângelo não é assim,  só é bom quando ele dá as cartas. Será uma luta difícil. Ele vai revidar.

Ernesto recebe uma ligação de Ângelo que está possesso com o que aconteceu. Logo diz que não aceitará afrontas deste tipo, mexer no território dele é inadmissível. A discussão é acalorada. Ernesto deixa a mesa de café e vai para o jardim. Tenta amenizar sem sucesso a fúria de Ângelo. Quando caminha de volta para tomar seu café, recebe uma ligação de Gilberto que pede que ele não se meta em discussões desnecessárias com Ângelo, porque ele precisa da liderança dele para a campanha de Governador. Ernesto percebe que foi longe demais.

Livro: Entre o cinza e o vermelho: poder, traição e sedução

Uma noite festiva
Uma festa que se torna o assunto da semana. Uma noite regada a bom whisky e muitas negociações. Jazz e blues, comida de qualidade como foie gras, e o verdadeiro champagne. Mulheres bem vestidas circulam pelas salas da casa imponente e de alto padrão. As conversas são animadas, muitas gargalhadas. As trocas de olhares ou um aceno de cabeça podem significar muito, podem  representar muito.
Uma conversa reservada, entre dois ou três personagens, e um reposicionamento na manhã seguinte, muda o rumo de um país. As negociações são sempre feitas na calada da noite, regada de  boa bebida e  mulheres prontas para atender os desejos daqueles poderosos.
Sempre há uma troca de favores entre eles, um cede aqui e ganha logo ali na frente. As relações entre eles não são de confiança, são baseadas no que cada um pode perder se trair o outro. O jogo é pesado, uma peça movimentada fora de hora e a derrota é certa. Quem tem mais sangue frio e é mais racional tem mais chance de avançar no meio e galgar os altos cargos. Por outro lado, o segundo escalão é feito de pessoas que se submetem aos desejos e imposições dos detentores do poder.
As mulheres que circulam neste ambiente, são quase sempre, do segundo escalão. São poucas as que conseguem abrir espaço no meio, e quase sempre são as que representam as minorias, que as fazem reféns de uma causa e impedem que se  destaquem. Uma ou outra, foge do padrão, pena que não duram muito tempo na mídia.
Os grandes pensadores e analistas, em seus discursos, dizem que a realidade deve mudar, só não identificam uma personalidade capaz de mobilizar a massa para que isto aconteça. Enquanto isto, entre um whisky, uma paixão de uma noite e um aceno de cabeça, as decisões são tomadas, e interferem na vida de milhares de pessoas, que não fazem a menor ideia do que esta acontecendo enquanto elas dormem em seus lares, com suas famílias.
Muitos copos de whisky e muitas gargalhadas, até a decisão final. Ernesto precisa convencer Augusto de que o melhor é apoiar Saulo como representante do grupo político deles na negociação, que poderá abrir uma investigação, que causará problemas para muitos dos presentes naquela festa.
Augusto e Ernesto, já foram grandes amigos e parceiros de festas em alto mar, regada a muita bebida e mulheres. Só que no momento, a relação entre eles é  fria e repleta de recalques, causados por uma apunhalada proferida por Ernesto. Augusto só queria uma coisa, que todas as suas vontades fossem atendidas.  A negociação era simples, bastava o seu interlocutor aceitas suas exigências e tudo estava certo.            
Ernesto apelou para o bom senso e para algumas trocas possíveis, liberações de processos e projetos que estavam empoeirando em gavetas, diante da burocracia que emperra os serviços públicos.  Augusto resistiu e disse que tinha outro candidato. Na realidade, ele e Saulo atravessam um momento de distanciamento, em função de discordância que resultou na ausência de votos para Júlio, fazendo Augusto amargar sua primeira derrota.
Augusto decidiu apoiar  Benicio, que apesar de representar a mesma ideologia política tem uma visão menos preservacionista dos seus pares. Para Benicio, aquele que tiver problemas que os resolva. E naquele momento, este pensamento, ia de encontro com o de Augusto. Já que Ernesto parecia estar na berlinda, sendo citado numa das gravações que envolvia um de seus colaboradores.
Já é madrugada, as disputas estão acirradas, de cadeiras em comissões, as mulheres que desfilam pelos salões. Gilberto é sempre reservado e mantêm uma distância segura de problemas, sejam eles políticos ou pessoais, é uma liderança regional que está num alto cargo e que mantém uma vida familiar e profissional distinta e simples. Um homem sério, que sabe muito bem reverter uma situação desfavorável, como poucos. 
Ele apenas observa todos os movimentos enquanto circula pelos vários grupos que se formam por aquelas salas. Ele observa a todos, ouve a todos e nunca fica até muito tarde. Antes de sua saída discreta, chama Ernesto e diz o que precisa fazer e com quem falará. Ernesto nem sempre concorda, mas sempre segue as determinações de Gilberto.
A festa estava animada, depois de muitas gargalhadas e muitas discussões, Ernesto e Augusto não chegaram a um acordo. Ernesto conhece alguém que é próxima de Augusto, ele a  chama e pede sua ajuda. Ela reluta porque sabe que é muito difícil demove-lo de uma decisão já tomada. Ernesto insiste, sabe que a amizade deles incomoda Augusto e usa isto para criar uma situação desgastante e alcançar seus objetivos.

Depois das 2 horas da madrugada, as decisões importantes dão espaço a curtição. Muitas risadas, olhares insinuantes e contatos trocados e encontros marcados. Agora a festa começa...